A musculação e a perda de gordura?
Você
com certeza já se perguntou, se o seu treino na musculação ajuda a emagrecer,
certo? Para responder esse questionamento, você deve primeiramente entender o
que é de fato emagrecer. Muitas pessoas acreditam que apenas diminuir o peso na
balança seja suficiente para emagrecer. Isso não é necessariamente verdade. O emagrecimento,
que grande parte das pessoas busca dentro das academias, pode ser definido como
a perda significativa de gordura corporal (redução no percentual de gordura) e
não a redução do peso corporal total. Em nosso organismo a gordura é estocada,
basicamente, em três locais: nas vísceras (tecido adiposo visceral), abaixo da
pele (tecido adiposo subcutâneo) e na musculatura (intramuscular).
Mas porque nosso corpo armazena
gordura?
Por
sermos seres naturalmente dependentes do oxigênio, sobrevivemos utilizando o
metabolismo aeróbio (o que consome oxigênio) para produzir a maior parte da
energia necessária durante o dia. A gordura (armazenada no tecido adiposo),
nada mais é do que uma reserva de energia a ser utilizada através deste
metabolismo. Dessa forma, o nosso corpo se prepara para situações de escassez
de comida. A ciência do esporte há muito tempo afirma que para utilizar os ácidos
graxos (moléculas de gordura) estocados em nosso tecido adiposo visceral e
subcutâneo os exercícios mais indicados seriam os aeróbios realizados em baixa
ou moderada intensidade, e por um longo período de tempo1. O famoso 30 minutos de caminhada ou corrida leve.
Essa indicação foi levantada antigamente pela ciência devido à complexidade e o
tempo necessário para oxidar (“queimar”) as moléculas de gordura e
principalmente pela necessidade de se ter um gasto energético elevado para
obtermos uma diminuição significativa dessa reserva2. Resumidamente, deveríamos caminhar ou correr por
muito tempo para que fosse possível elevarmos o gasto de ATP (energia) e
manteríamos essa atividade em baixa intensidade para garantir que essas
energias fossem fornecidas pelo metabolismo aeróbio, ou seja, através da
oxidação das gorduras. No entanto, pesquisas recentes vêm destacando também a
grande eficiência da musculação para tais objetivos. A literatura científica tem
demonstrado que o treinamento com pesos, é capaz de diminuir a quantidade de
gordura corporal, principalmente, nos momentos pós-treino.
Então a musculação queima gordura?
Quando
terminamos uma sessão de treino de musculação, nosso organismo aumenta o
consumo de oxigênio por até 5 horas. Esse fenômeno é chamado de EPOC, ou
aumento no consumo de oxigênio pós-exercício (Excess Post-exercise Oxygen Consumption). Inicialmente, os pesquisadores creditavam esse
aumento no consumo de oxigênio a uma maior oxidação de um produto de nosso
metabolismo (lactato), produzido durante o exercício. De acordo com a ciência
do esporte, existe uma relação positiva entre a duração e a intensidade do
exercício no aumento do consumo de oxigênio após atividade. Isso quer dizer que
quanto mais intenso e volumoso for o treino (mais carga e repetições, por
exemplo), maior será o consumo de oxigênio pós-esforço1. Estudos canadenses mais atuais, do laboratório do professor
Martin Gibala3-5, demonstrou
que após a realização de exercícios intensos, as células musculares se tornam
mais sensíveis à utilização de gordura como fonte de energia. Pesquisadores chineses7, demonstraram que a
utilização de gordura foi maior após a realização de um treinamento mais
intenso na musculação quando comparado a um treino de menor intensidade. A
principal responsável por esta maior sensibilidade é uma enzima chamada AMPK. Essa
enzima é como um “sensor” metabólico, a fim de favorecer a utilização de
gordura e poupar o glicogênio muscular (reserva de energia a ser utilizada
preferencialmente, pelo metabolismo anaeróbio). Além disso, outro fator que vai
a favor do aumento da queima de gordura em treinamento intenso, como a
musculação, é a liberação do hormônio cortisol6. Este hormônio possui uma importante função metabólica
na quebra dos triglicérides (moléculas de gordura) estocadas no tecido adiposo,
liberando-os na corrente sanguínea. Após o exercício essa liberação de
triglicérides é fundamental para o fornecimento de energia ao processo de
reconstrução muscular6. Portanto,
para reconstruirmos a musculatura danificada, necessitaremos de muita energia,
que virá do substrato mais energético, porém, o menos desejado em nosso
organismo, a gordura!
Dessa
maneira, enquanto você se desloca para sua casa ou trabalho, após mais um
treino intenso na musculação, suas células musculares estarão “loucas” para
consumir as gorduras que tanto você queria! E mais... Mesmo quando você estiver
descansando, elas também precisarão de energia, pois lembre-se, após os treinos
intensos, nosso consumo de oxigênio aumenta, isso quer dizer que, continuaremos
a queimar as gorduras por até 5 horas após sairmos da academia. A musculação
também ajuda a emagrecer a longo prazo, pois com uma musculatura mais
desenvolvida, parece óbvio, que necessitaremos de mais energia para manter este
tecido vivo, correto? Perfeito... Para permitir que a célula muscular, agora
hipertrofiada, permaneça desempenhando seus papéis fundamentais, o organismo
aumenta o suprimento e a oxidação de gordura em repouso. Isso é o que explica o
aumento da taxa metabólica de repouso em indivíduos treinados7. Esse aumento no gasto
calórico durante o repouso garante que o indivíduo continue ingerindo a mesma
quantidade de alimentos e calorias e mesmo assim consiga emagrecer, pois o seu
corpo estará consumindo mais energia do que antes. Esses fatores em conjunto
fazem com que os treinamentos realizados em alta intensidade, como os da
musculação, sejam estratégias interessantes e eficazes para a perda de gordura.
Conclusões
O
treinamento de musculação:
·
Aumenta o consumo de oxigênio
pós-exercício por até 5 horas (EPOC);
·
Aumenta a secreção do hormônio cortisol
que favorece a lipólise (quebra da reserva de gordura no tecido adiposo);
·
Ativa enzimas chamadas de “Sensores
Metabólicos” (AMPK) que favorecem a utilização de gordura pelas células
musculares;
·
Aumenta o consumo de gorduras para a
reconstrução da musculatura lesionada;
·
A longo prazo, aumenta a massa magra,
aumentando assim a taxa metabólica de repouso e fazendo o organismo gastar mais
calorias durante o dia.
Referências
1
Borsheim E, Bahr R. Effect of exercise intensity, duration and mode on
post-exerccise oxygen consumption. Sports
medicine. 2003;33(14): 1037-60.
2
Spriet, LL, Heigenhauser, GJ. Regulation of pyruvate dehydrogenase (PDH)
activity in human skeletal muscle during exercise. Exerc Sport Sci Rev. 2002 Apr;30(2):91-5.
3 Gibala MJ, McGee SL.
Metabolic adaptations to short-term high-intensity interval training: a little
pain for a lot of gain? Exerc Sport Sci
Rev. 2008 Apr;36(2):58-63.
4 Gibala MJ. High-intensity
interval training: a time-efficient strategy for health promotion? Curr Sports Med Rep. 2007
Jul;6(4):211-3.
5
Gibala MJ, McGee SL, Garnham AP, Howlett KF, Snow RJ, Hargreaves M.
Brief intense interval exercise activates AMPK and p38 MAPK signaling and
increases the expression of PGC-1alpha in human skeletal muscle. J Appl Physiol (1985). 2009
Mar;106(3):929-34.
6 Hayes LD, Bickerstaff GF,
Baker JS. Interactions of cortisol, testosterone, and resistance training:
influence of circadian rhythms. Chronobiol
Int. 2010 Jun;27(4):675-705.
7 Wu BH, Lin JC. Effects of
exercise intensity on excess post-exercise oxygen consumption and substrate use
after resistance exercise. J Exerc
Sci Fit. 2006; 4(2):103-109.