Em 1985, o American
College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) publicou suas primeiras
diretrizes sobre a prática de atividades físicas durante a gravidez e o período
pós-parto. Dada a escassez de estudos na época, essas orientações foram por
demais conservadoras (ACOG, 1985), inclusive mais cautelosas que as
recomendações do American College of Sport and Medicine (ACSM) de 1978, dentre
as quais orientava que a intensidade do exercício para a gestante deveria ser
baseada na frequência cardíaca máxima de 140 bpm. Segundo Mudd et al. (2013),
essa recomendação não foi embasada em estudos científicos, mas ainda é aceita
pela maioria das pessoas que acreditam que intensidades maiores colocariam em
risco a saúde da gestante e do feto.
Entretanto, Mudd et
al. (2013) concluíram que gestantes aptas a praticarem atividades físicas podem
suportar intensidades maiores que as recomendas pelos ACSM e ACOG. Uma
compravação disso foi a pesquisa citada por Clapp et al. (2000) na qual 50
mulheres grávidas que participavam de aulas de ciclismo indoor, de três a cinco
vezes por semana, não tiveram nenhuma complicação ao treinarem com frequência
cardíaca entre 150 e 160 bpm. Outro estudo também realizado com bicicletas
estacionárias, não encontrou efeitos negativos de um treinamento com 70% da
frequência cardíaca máxima (Webb, 1994).
Desta maneira, o
que nos parece mais apropriado seria analisar cada gestante individualmente, e
não nos basearmos em um padrão absoluto. Por exemplo, mulheres atletas ou
fisicamente ativas antes da gestação, deveriam ser avaliadas diferentemente das
mulheres obesas, sedentárias ou portadoras de doenças. Assim ficaria mais fácil
focar nas reais complicações que podem acontecer durante a prática de
atividades físicas como: o aumento da temperatura corporal e da circulação de
hormônios responsáveis pelo estresse, diminuição do fluxo sanguíneo
intrauterino e impacto biomecânico. Efeitos esses que podem levar ao aborto,
malformação congênita, dano cerebral, trauma fetal, retardo no crescimento, trabalho
de parto mais demorado, hemorragias e lesões músculo esqueléticas (Clapp et
al., 2000).
Apesar de esses
riscos existirem, não há dados que mostrem o comprometimento da gestação com a
prática de exercícios por mulheres saudáveis. Ao contrário disso, as
estatísticas demonstram que a incidência de infertilidade, abortos espontâneos,
malformação placentária e anormalidades congênitas em mulheres que continuaram
suas atividades físicas, por vezes vigorosas, não são maiores que nas gestantes
sedentárias. Inclusive, vários estudos não relatam efeitos negativos no
trabalho de parto, rupturas das membranas, nem nascimento prematuro (Bell et
al., 1995; Kardel e Kase, 1998; Lokey et al., 1991; Pivanik et al., 1994; Clapp
et al., 2000; Mudd et al., 2013).
Dois estudos
constataram que gestantes que se exercitaram com intensidade alta tiveram mais
benefícios que aquelas que treinaram com intensidade baixa. As que fizeram mais
esforços conseguiram diminuir em até 85% o tempo do trabalho de parto e tiveram
bebês mais leves (saudáveis - com menos gordura corporal) (Bell et al., 1995;
Clapp et al., 1996).
Em 2005, o ACSM
realizou uma mesa redonda para avaliar a literatura disponível até aquele
momento, e concluiu que a atividade física não traz prejuízo à gestante. Na realidade,
traz inúmeros benefícios tanto para mãe quanto para o feto (Pirvanik et al,
2006). No entanto, vale ressaltar que a prescrição é muito complexa e depende
de vários fatores, sendo muito difícil chegar a uma “dose ideal”,
principalmente por não haver na literatura bases científicas que ajudem a
determinar o volume e a intensidade do treinamento. Neste sentido, esse texto
não tratará sobre prescrição, e sim, de informações a respeito dos benefícios
adquiridos por gestantes que se exercitaram antes, durante e após a gravidez.
Benefícios para o
feto antes e após o parto
Os principais
benefícios da prática de exercícios para o feto, durante a gestação, são
ocasionados pelos efeitos na redução intermitente do fluxo sanguíneo uterino,
pelo crescimento da placenta e pela menor disponibilidade de nutrientes devido
às alterações na função placentária. As conseqüências disso são bebês mais
magros ao nascer (Bell et al., 1995; Clapp et al., 1996; 2000), com maior
tolerância às tensões fisiológicas na gravidez tardia e no trabalho de parto
(Clapp et al., 1996, 2000). É importante destacar que, apesar do baixo peso ao
nascer, não há aumento no risco de prematuridade comparado aos recém-nascidos
de mulheres sedentárias (Misra et al.1998; Hatch et al., 1998; Mudd et al.,
2013).
Em outro estudo,
observou-se que, logo após o parto, os recém-nascidos das “mães atletas” estão
mais alertas e menos irritados. Tudo indica que esses comportamentos são devido
ao resultado da estimulação fetal que ocorreu durante os exercícios. Os autores
chamam isso de impressão fetal (efeitos dos fatores ambientais experimentados
pelo feto como: o ruído, movimento rítmico, açúcar elevado no sangue, maior
demanda de oxigênio etc.).
Essas influências
durante a gravidez podem repercutir no pós-parto, ao longo da infância e muitas
vezes por toda a vida (Nathanielsz, 1999; Clapp et al., 1999; 2000). Para
comprovar essa hipótese, Clapp et al. (1996, 1999) examinaram crianças com
idade entre um e cinco anos, e verificaram que os filhos das mulheres que se
exercitaram durante a gravidez apresentaram melhores habilidades mentais e
motoras, eram mais magras e apresentaram melhor desempenho em testes de
inteligência.
O que o futuro
reserva para essas crianças é incerto, mas prevê que se mantenham magras,
inteligentes e com melhor função cardiovascular e metabólica, o que poderá
contribuir para uma boa capacidade atlética quando jovens (Mudd et al., 2013;
Clapp et al., 2000).
Benefícios maternos
após o parto
Utilizando exames e
questionários realizados ao longo do primeiro ano após o parto, Clapp et al.
(2000) avaliaram a saúde mental, ganho de peso, melhora da região abdominal,
lesão músculo esquelética e funcionamento da bexiga de 150 voluntárias. Os
resultados seguem abaixo:
- As gestantes que
se exercitaram durante e após o parto demonstraram uma condição psicológica
melhor do que as sedentárias. Tudo indica que parte desse benefício foi devido
ao fato de que, ao conseguirem tempo para fazer os exercícios, as mulheres
estavam dedicando um momento para cuidarem de si enquanto a rotina das suas
vidas estava mudando. Com isso, o resultado final foi uma diminuição no
estresse e nos sintomas da depressão (em até 60%), o que refletiu positivamente
na relação materno-infantil.
- As estatísticas
demonstraram que mais de 90% das mulheres que realizaram exercícios
periodicamente durante a gravidez continuaram sua rotina após o parto, e 70%
conseguiram atingir sua forma física pré-gestacional. O tempo médio para
voltarem a se exercitar foi de duas semanas , variando entre três dias e oito
semanas. A maioria conseguiu atingir a intensidade pré-gravidez em seis meses
e, o mais curioso, com capacidade aeróbia muitas vezes maior (6%-15%) que o
nível pré-gestacional.
- Um ano após o
parto, as mulheres que se exercitavam tiveram 30% mais chances de voltarem ao
peso e percentual de gordura pré-gravidez.
- Com relação à
aparência da região abdominal, os autores aplicaram um questionário no qual as
voluntárias davam uma nota de 0 a 10 para suas barrigas. Para aquelas que
faziam exercícios regulares, a média das notas foi igual a 8. Já as que não
praticavam nenhum tipo de atividade física a nota máxima foi 4.
- Nove a cada 10
mulheres não relataram dores, sangramentos intensos, lesões
músculo-esqueléticas, problemas reprodutivos ou de amamentação associados ao
retorno à prática de atividades físicas.
- Durante a
gravidez, muitas mulheres desenvolvem uma perda no controle da bexiga. Para
algumas, isso se torna um problema crônico após o parto. Inclusive, uma das
preocupações dos médicos é que isso possa ser agravado com a prática de
exercícios. No entanto, foi verificado que, no período imediato após o parto, a
incidência desse tipo de problema foi maior no grupo controle (60%) que no
grupo das mulheres que realizaram exercícios (40%). Esses valores normalmente
caem progressivamente em ambos os grupos ao longo do tempo. Mas, um ano depois,
a incidência no grupo do exercício foi 20% menor.
Parto normal x
cesariana
Acreditava-se que a
prática de atividade física durante a gestação pudesse estimular
indiscriminadamente as contrações uterinas provocando a antecipação do trabalho
de parto. Contudo, outros fatores, como a idade (menos de 20 e mais de 40
anos), tabagismo, gestação múltipla, diabetes e pré-eclampsia, são mais preocupantes
(Bishop et al., 1992; Lawn et al., 2010).
Bungum et al.
(2000) e Dumith et al. (2012) verificaram um menor risco de parto cesariano em
mulheres que realizavam exercícios físicos, especialmente nos dois primeiros
trimestres de gravidez. Já em gestantes sedentárias, esse risco chegava a ser
4,5 vezes maior (Bungum et al., 2000).
Ganho de peso
gestacional
Mulheres que ganham
muito peso durante a gestação têm maiores riscos de diabetes, de hipertensão
gestacional e de gerarem bebê macrossômico (peso superior a 4kg). Neste
sentido, o controle de peso antes, durante a após a gestação é fator primordial
para a saúde tanto da gestante quanto do feto (Mudd et al., 2013).
Vários estudos
verificaram que a atividade física bem orientada é capaz de ajudar na prevenção
do excesso de peso durante a gestação (Clapp et al., 1995; Mudd et al., 2013).
Um exemplo disso foi a pesquisa de Clapp et al. (1995) na qual as gestantes que
praticavam exercícios eram em média 4kg mais magras que as sedentárias.
Vale a pena destacar
a importância da dieta no controle do peso, pois mulheres que se exercitam e se
alimentam de forma saudável, ao final da gestação, podem pesar até 7kg a menos
do que aquelas que fazem somente exercícios (Clapp et al.1995).
Conclusão:
Podemos concluir
que a atividade física durante a gestação pode trazer diversos benefícios para
o feto como:
- Menor risco de
nascer macrossômico;
- Maior tolerância
para as tensões fisiológicas na gravidez tardia;
- Maior tolerância
ao trabalho de parto;
- Melhor tolerância
ao estresse;
- Melhor
desenvolvimento neurológico;
- Menor peso ao
nascer (saudável);
- Menor risco de
prematuridade;
- Recém-nascidos
mais alertas e menos irritados;
- Maiores chaces de
serem magros, mais inteligentes e com melhor função cardiovascular, motora e
metabólica quando crianças.
Os benefícios
maternos incluem:
- Melhora da função
cardiovascular;
- Melhora do estado
psicológico;
- Ajuda no controle
do peso corporal;
- Contribui para
uma recuperação pós-parto mais rápida;
- 30% mais chances
de voltarem ao peso pré-gravidez;
- Diminui os riscos
de parto prematuro e cesariano;
- Diminui as dores
e os sangramentos intensos;
- Previne lesões
músculo-esqueléticas;
- Ajuda no controle
da bexiga.
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